Testes "in vitro" e utilizando ratos indicaram que a proteína, batizada de EcTI devido à sua ação inibidora da enzima tripsina, bloqueou parcial ou totalmente a proliferação das células de vários tipos de câncer.
"Ela bloqueou os processos que fazem com que o tumor cresça e que faça metástase, ou seja, que migre para fazer outras invasões", afirma a professora de bioquímica da Unifesp Maria Luiza Vilela Oliva, coordenadora das pesquisas.
As informações foram apresentadas na última semana, durante a reunião anual da Federação de Sociedades de Biologia Experimental (Fesbe), em Caxambu, Minas Gerais. A atuação da proteína contra células do câncer de mama inicialmente é positiva e está sendo analisada, de acordo com a professora.
Melanoma
Ratos com um tipo de melanoma agressivo foram usados em experimentos com a EcTI, que inibiu o crescimento do câncer. "Alguns animais sequer chegaram a desenvolver o tumor. Em outros, [a proteína] inibiu 90%", afirma Maria Luiza.
Já estudos com células do câncer gástrico apontaram que a EcTI impediu a adesão a tecidos saudáveis e inibiu a formação de "protuberâncias" celulares relacionadas à metástase e migração cancerígena, as chamadas "invadopodias".
Durante os testes, também foi constatado que a proteína tem ação antitrombótica (agindo contra a formação de trombose) e anticoagulante. Um dos últimos estudos sobre a EcTI foi publicado no site da revista científica "PLoS One", em abril deste ano, e detalhou a estrutura da proteína.
À esquerda, fruto da planta; à direita, sementes de
onde a proteína é extraída. (Foto: Divulgação/Maria
Luiza Vilela Oliva)
Efeitos colaterais
Ainda precisam ser feitas pesquisas para entender a toxicidade e possíveis efeitos colaterais da EcTI, diz Maria Luiza. Ela, no entanto, ressalta que de início não foram identificadas reações adversas durante testes em ratos. "Até o momento, não vimos toxicidade, aplicamos 4 miligramas em ratos e não houve nenhuma morte", afirma.
Possíveis efeitos alérgicos da proteína também precisam ser analisados, mas até agora experiências mostraram que ela não deve causar alergia, disse a professora da Unifesp. Um dos próximos passos é também ver como a EcTI age em células do fígado humano.
O grupo de pesquisadores também está analisando "fragmentos" derivados da proteína, os chamados peptídeos, para entender como eles agem separadamente.
"Não se pode aplicar a proteína na veia de um ser humano", diz a cientista, ponderando que ainda são necessários muitos testes antes de viabilizar o uso em terapias contra o câncer em pessoas.
Um peptídeo, diz ela, é mais simples de ser usado em um tratamento, possivelmente por aplicação em via intravenosa. É provável que no futuro a proteína seja feita de forma "recombinante", utilizando bactérias manipuladas geneticamente para produzir a EcTI e assim eliminar a necessidade de extraí-la da planta, afirma a cientista.
Árvore
A orelha-de-macaco, conhecida também como tamboril ou timbaúva, é uma árvore encontrada principalmente nas regiões Centro-Oeste (no Mato Grosso do Sul) e Sul (Rio Grande do Sul), mas também ocorre em estados como Maranhão, Piauí e Pará, aponta um estudo do Instituto Florestal de São Paulo, ligado à Secretaria Estadual do Meio Ambiente.
A árvore alcança altura média de 20 a 30 metros e tronco de 80 a 160 centímetros de diâmetro, segundo o estudo. Sua madeira é leve e era utilizada por indígenas para fabricação de canoas - ela pode servir para produção de caixotes, miolo de portas, armação de móveis e outras finalidades.
Com o nome científico de Enterolobium contortisiliquum, a árvore "é indicada para o reflorestamento de áreas degradadas de preservação permanente, em plantios mistos, por apresentar crescimento rápido inicial", afirma o texto do Instituto Florestal.
O fruto da planta tem formato parecido com uma orelha, daí o nome popular. "Quando você abre o fruto, encontra as sementes. A gente retira dali o cotilédone e isola várias proteínas.
Uma delas [a EcTI] tem ação inibidora de protease", afirma a professora. A "protease", em questão, é a enzima tripsina. A sigla EcTI significa, em inglês, "Enterolobium contortisiliquum Inibidora de Tripsina".