27 de ABRIL de 2013 - Após declarações polêmicas acerca de temas como a homossexualidade,
fidelidade e necessidade de mudanças na estrutura da Igreja Católica nas
redes sociais que causaram um pedido de retratação por parte da Diocese
de Bauru (SP), Roberto Francisco Daniel, conhecido como padre Beto,
anunciou neste sábado (27), que deixará de exercer suas funções como
padre a partir de segunda-feira (29).
Essa era a data limite para “confissão humilde de que errou quanto a
sua intepretação e exposição da doutrina, da moral e dos bons costumes
ensinados pela igreja", como exigia a nota assinada pelo Bispo Dom
Caetano Ferrari na última terça-feira (23), que pedia a retratação e
retirada do conteúdo, contrário aos dogmas da Igreja, publicados na
internet. “Eu não tenho do que me redimir. Muito menos a quem ou do que
pedir perdão de tudo aquilo que eu fiz e declarei nas redes sociais. Se
refletir é um pecado, eu sou um pecador e sempre serei. Não vou negar
ser uma pessoa reflexiva e uma pessoa que pensa”, declarou o padre que,
com sua decisão, deixa de celebrar casamentos, missas e outro rituais
religiosos.
Acredito que não é possível ser cristão em uma instituição que cria hipocrisia"
Padre Beto
Na entrevista coletiva realizada na manhã deste sábado, o sacerdote
afirmou aos jornalistas que sua decisão foi tomada após várias
reflexões, entre elas, a de não aceitar que seja possível seguir um
modelo que não respeita a liberdade de reflexão e expressão por parte
dos fiéis e membros do clero.
“Acho impossível seguir o evangelho de Jesus Cristo em uma instituição
que, no momento, não respeita a liberdade de reflexão e de expressão. O
modelo que nos temos que seguir se chama Jesus Cristo e esse modelo
viveu plenamente essa liberdade e fez com que as pessoas refletissem”,
explica.
“Além disso, acredito que não é possível ser cristão em uma instituição
que cria hipocrisia. Nós estamos em um momento em que a igreja faz
questão de manter regras morais que são totalmente ultrapassadas para a
nossa época e também em frente à ciência”, diz o padre irá entregar a
carta de pedido de afastamento para o bispo na segunda-feira. Ele também
divulgou uma nota no seu perfil em uma rede social, onde explica a
decisão para o seus mais de 2.500 seguidores.
Até logo?
Apesar da decisão do sacerdote de deixar de celebrar os rituais
católicos, padre Beto afirma que continua sendo padre e que sua saída do
cenário católico de Bauru não é definitiva e que pode voltar à igreja se alguns pensamentos forem mudados.
“Não vou deixar de ser padre. Uma vez padre, sempre padre e vou viver
na integridade de um padre. O que vou deixar de fazer é exercer os meus
ministérios dentro da igreja católica como missas, casamentos, etc., mas
permaneço como sacerdote, consciente de que fui ordenado e como um
cristão que pensa”.
Questionado, padre Beto alega que não pretende fundar outras religiões e
que a sua saída não tem nenhuma pretensão política, mas que também não
pretende atuar em outras Dioceses por enquanto. Segundo o sacerdote, o
clero sabe que impõe regras que as pessoas não vivem e fecha os olhos
para as mudanças do mundo. "Eu não acredito que a marioria dos casais
que frequentam a igreja não usam métodos contraceptivos. Nós temos
regras que não são exercidas e isso precisa ser refletido".
O padre também se referiu à uma omissão da igreja a respeito de
problemas sociais graves como educação, saúde e comunicação. "A igreja
como instituição forte que é deveria ter uma postura muito mais firme em
frente ao congresso nacional. Os professores são mal pagos, o sistema
penitenciário é péssimo e temos um código penal ultrapassado", desabafa.
‘Deixo meus exercícios como padre e permaneço com a minha coerência de
como atuaria Cristo no mundo em que vivemos hoje, um mundo
contemporâneo’, diz o sacerdote.
'Ele é um filho rebelde que avança o sinal', disse o
bispo na entrevista (Foto: Ana Carolina Levorato/G1)
Decepção
Padre Beto é conhecido na cidade por suas publicações em diversos meios, mas em entrevista concedida ao G1
na quinta-feira (25), Dom Caetano diz que apesar de existir um público
que compartilha e segue suas opiniões, há uma grande parte dos fiéis que
não concorda com as palavras do padre. “Ele gostaria que eu como bispo o
apoiasse, mas digo a ele ‘Beto, coloque-se no seu lugar, quem te deu
essa inspiração para uma missão profética de revolucionar a teologia, a
doutrina e a moral da Igreja?’, argumenta o bispo.
Sobre a declaração do bispo, padre Beto afirma ter recebido a posição
de Dom Caetano com certa decepção. “Recebi as declarações dele por um
lado com decepção. Eu esperava que ele diante de criticas feitas à minha
reflexão, que pensasse que tem um padre que reflete e que a igreja que
precisa de alguém assim”, conta. “O que eu falei são reflexões e não um
embate à Igreja Católica. Não atinjo a ordem da instituição de forma
alguma”, completa.
De acordo com a assessoria imprensa da Diocese, o bispo só irá se
manifestar oficialmente sobre o pedido de afastamento de Padre Beto na
segunda-feira, quando a carta do sacerdote foi entregue a instituição.
Pedido de retratação
A nota oficial foi divulgada no site da Diocese na terça-feira (23) e
pedia retratação do sacerdote até dia 29 de abril. Dom Caetano afirma
que essa foi a primeira retratação formal pedida pela Igreja ao padre e
que vídeos publicados na internet recentemente se tornaram a “gota
d'água” para que uma atitude fosse tomada. Nas publicações, o padre
discute temas como fidelidade, bissexualidade, divórcio e a necessidade
de mudanças na estrutura da Igreja Católica.
Na página oficial da Diocese de Bauru em um site de relacionamentos,
internautas se manifestaram com comentários de apoio e repúdio à decisão
de Dom Caetano. A discussão sobre as opiniões do padre não só partiram
de Bauru, mas também de fieis de outras partes do Brasil e, ainda de
acordo com a assessoria da Diocese, foi um dos motivos que levou a
decisão de pedir a retratação.
Com um camisa preta com os dizeres 'não obrigado' em espanhol, padre decidiu deixar a igreja.