Imagem de câmera de segurança de hospital do DF
do momento em que mãe teria aplicado insulina em bebê
(Foto: Reprodução)
09 de OUTUBRO 2017 - A Polícia Civil do Distrito Federal indiciou um casal por tentativa de homicídio contra o filho de 2 meses - eles são suspeitos de praticar o crime usando injeção de insulina. Segundo as investigações, eles tentaram forjar um quadro de hiperinsulinismo congênito – doença que faz o pâncreas produzir o hormônio em grande quantidade – para arrecadar dinheiro com comoção popular. Os pais do bebê negam a intenção de matá-lo.
Dois irmãos da criança morreram com o diagnóstico no ano passado. Na época, a família apelou por ajuda em redes sociais alegando que não recebia auxílio do Estado. A situação também foi denunciada pelo Ministério Público. O caso corre em segredo de Justiça.
A suspeita ocorreu durante a internação do menino no Hospital Universitário de Brasília (HUB) e foi investigada pela equipe da delegada Ana Cristina Melo Santiago. A criança deu entrada na unidade de saúde em junho, após uma convulsão. Os médicos conseguiram reverter o quadro, mas decidiram investigar o caso após os pais relatarem ter tido mais três filhos (incluindo os dois que morreram) com a doença.
Para os profissionais, os resultados dos exames foram incoerentes (veja abaixo). Uma nova investigação foi realizada e apontou que o quadro era “proposital”. Para preservar o bebê, o Conselho Tutelar foi acionado. Além disso, o menino foi encaminhado à Unidade de Cuidados Intermediários Neonatais (Ucin), onde o acesso da família era limitado.
Já instalado na Ucin, o menino apresentou novo quadro de hiperinsulinismo. De acordo com a investigação, por volta das 18h do dia 19 de julho, a equipe de enfermagem foi acionada pela mãe da criança para avaliação da glicemia.
O hospital decidiu analisar as filmagens do circuito de segurança. Por volta de 17h50, a mulher estava com o menino no colo, “em movimento que sugere a administração exógena de substância que se acredita tratar de insulina de ação rápida, o que justifica a alteração do quadro de hipoglicemia exposto”, segundo a investigação.
“O efeito da insulina é diminuir as concentrações de glicose no sangue. A administração inadequada em quem não precisa pode levar a hipoglicemias graves, crises convulsivas, lesões irreversíveis do cérebro, comprometendo o desenvolvimento da criança, e até óbito, caso não vista e socorrida a tempo.”
O caso foi denunciado à Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente (DPCA). Uma seringa foi encontrada pela delegada dentro da roupa íntima da mãe. Em depoimento à polícia, a mulher confessou ter injetado o medicamento no bebê alegando que “ele estava com a glicemia muito alta”, mesmo sabendo que ele estava sendo medicado e que a conduta dela poderia colocar a vida do filho em risco.
Ela não quis dizer como conseguiu insulina. Para a investigação, o pai do menino – que trabalha há um ano como entregador de uma farmácia – forneceu o produto.
Por decisão da Justiça, os pais não puderam mais ter contato com o bebê nem com os outros três filhos. Os quatro foram encaminhados para um abrigo, onde estão há dois meses. Em depoimento à polícia, o médico disse que o quadro do bebê melhorou.
“Era uma criança irritadiça e chorosa que se transformou após o afastamento da genitora, ficando mais tranquilo e interagindo com os cuidadores”, disse.
“Do ponto de vista médico, ele não fez mais nenhuma crise convulsiva e nenhum episódio de hipoglicemia, mesmo sem uso de qualquer medicação para controle do açúcar no sangue durante os 10 dias que permaneceu afastado dos outros genitores naquele hospital”, informou o médico.
Também por decisão judicial, a outra filha do casal que tem o diagnóstico de hiperinsulinismo congênio foi internada por dez dias para que se verificasse se os quadros de hipoglicemia e de crises convulsivas descritos pela família eram verdadeiros ou se também eram provocados. Os remédios usados pela menina, que tem 5 anos, foram suspensos. Desde então, ela não teve sintomas da doença. As taxas de glicose e insulina foram normalizadas, afirma a investigação.
Segundo o médico, a garota tem pequeno atraso no desenvolvimento neurocognitivo, que pode ter sido provocado pelos episódios de hipoglicemia. Por causa da doença, ela recebia o Benefício de Prestação Continuada (BPC).
Os pais das crianças chegaram a ajuizar uma ação de indenização por danos materiais e morais contra o governo do Distrito Federal por causa da falta de medicamento para uma das crianças que morreu. O casal ganhou na primeira instância.
Como o caso foi descoberto
O garoto deu entrada na unidade de saúde aos 50 dias de vida com uma crise convulsiva. A glicemia capilar dele era 18 mg/dL – a referência é de 60 mg/dL a 99 mg/dL em jejum. O quadro, considerado grave, foi revertido. Como os pais relataram que três irmãos do bebê (incluindo os dois que morreram) tinham hiperinsulinismo congênito, os médicos decidiram investigar se ele também apresentava a doença.
De acordo com relatório dos profissionais, mesmo recebendo a medicação adequada, o bebê apresentou insulina > 1.000 mcUI/ml, quando a referência é 2,6 mcUI/ml a 24,9 mcUI/ml. “Valores tão elevados de insulina não são esperados para hiperinsulinismo endógeno (quando o próprio pâncreas do indivíduo produz a insulina), mesmo em situações em que se suspeita de hiperinsulinismo congênito.”
Diante disso, os médicos pediram novo exame (dosagem de peptídeo C). De acordo com os profissionais, quem apresenta a doença também tem o peptídeo C elevado. O resultado do teste, porém, foi de 0,29 ng/mL (referência 1,1 ng/mL a 4,4 ng/mL). A incompatibilidade dos dados somada ao fato de que o bebê apresentava hipoglicemia intercalada com hiperglicemias relevantes chamou a atenção da equipe.
“Novas investigações foram realizadas, inclusive com a redução medicamentosa para observação do comportamento da glicemia no paciente em comento, tendo sido verificado um quadro ainda mais grave, com insulina marcando 6.422,3 mcUI/ml e peptídeo C suprimido, confirmando-se, portando, o quadro de hiperinsulinismo factício”, informou o hospital à polícia.
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DISTRITO FEDERAL
Por Mara Puljiz e Raquel Morais, TV Globo e G1 DF
09 de OUTUBRO 2017 - A Polícia Civil do Distrito Federal indiciou um casal por tentativa de homicídio contra o filho de 2 meses - eles são suspeitos de praticar o crime usando injeção de insulina. Segundo as investigações, eles tentaram forjar um quadro de hiperinsulinismo congênito – doença que faz o pâncreas produzir o hormônio em grande quantidade – para arrecadar dinheiro com comoção popular. Os pais do bebê negam a intenção de matá-lo.
Dois irmãos da criança morreram com o diagnóstico no ano passado. Na época, a família apelou por ajuda em redes sociais alegando que não recebia auxílio do Estado. A situação também foi denunciada pelo Ministério Público. O caso corre em segredo de Justiça.
A suspeita ocorreu durante a internação do menino no Hospital Universitário de Brasília (HUB) e foi investigada pela equipe da delegada Ana Cristina Melo Santiago. A criança deu entrada na unidade de saúde em junho, após uma convulsão. Os médicos conseguiram reverter o quadro, mas decidiram investigar o caso após os pais relatarem ter tido mais três filhos (incluindo os dois que morreram) com a doença.
Para os profissionais, os resultados dos exames foram incoerentes (veja abaixo). Uma nova investigação foi realizada e apontou que o quadro era “proposital”. Para preservar o bebê, o Conselho Tutelar foi acionado. Além disso, o menino foi encaminhado à Unidade de Cuidados Intermediários Neonatais (Ucin), onde o acesso da família era limitado.
Já instalado na Ucin, o menino apresentou novo quadro de hiperinsulinismo. De acordo com a investigação, por volta das 18h do dia 19 de julho, a equipe de enfermagem foi acionada pela mãe da criança para avaliação da glicemia.
O hospital decidiu analisar as filmagens do circuito de segurança. Por volta de 17h50, a mulher estava com o menino no colo, “em movimento que sugere a administração exógena de substância que se acredita tratar de insulina de ação rápida, o que justifica a alteração do quadro de hipoglicemia exposto”, segundo a investigação.
“O efeito da insulina é diminuir as concentrações de glicose no sangue. A administração inadequada em quem não precisa pode levar a hipoglicemias graves, crises convulsivas, lesões irreversíveis do cérebro, comprometendo o desenvolvimento da criança, e até óbito, caso não vista e socorrida a tempo.”
O caso foi denunciado à Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente (DPCA). Uma seringa foi encontrada pela delegada dentro da roupa íntima da mãe. Em depoimento à polícia, a mulher confessou ter injetado o medicamento no bebê alegando que “ele estava com a glicemia muito alta”, mesmo sabendo que ele estava sendo medicado e que a conduta dela poderia colocar a vida do filho em risco.
Ela não quis dizer como conseguiu insulina. Para a investigação, o pai do menino – que trabalha há um ano como entregador de uma farmácia – forneceu o produto.
Por decisão da Justiça, os pais não puderam mais ter contato com o bebê nem com os outros três filhos. Os quatro foram encaminhados para um abrigo, onde estão há dois meses. Em depoimento à polícia, o médico disse que o quadro do bebê melhorou.
“Era uma criança irritadiça e chorosa que se transformou após o afastamento da genitora, ficando mais tranquilo e interagindo com os cuidadores”, disse.
“Do ponto de vista médico, ele não fez mais nenhuma crise convulsiva e nenhum episódio de hipoglicemia, mesmo sem uso de qualquer medicação para controle do açúcar no sangue durante os 10 dias que permaneceu afastado dos outros genitores naquele hospital”, informou o médico.
Também por decisão judicial, a outra filha do casal que tem o diagnóstico de hiperinsulinismo congênio foi internada por dez dias para que se verificasse se os quadros de hipoglicemia e de crises convulsivas descritos pela família eram verdadeiros ou se também eram provocados. Os remédios usados pela menina, que tem 5 anos, foram suspensos. Desde então, ela não teve sintomas da doença. As taxas de glicose e insulina foram normalizadas, afirma a investigação.
Segundo o médico, a garota tem pequeno atraso no desenvolvimento neurocognitivo, que pode ter sido provocado pelos episódios de hipoglicemia. Por causa da doença, ela recebia o Benefício de Prestação Continuada (BPC).
Os pais das crianças chegaram a ajuizar uma ação de indenização por danos materiais e morais contra o governo do Distrito Federal por causa da falta de medicamento para uma das crianças que morreu. O casal ganhou na primeira instância.
Como o caso foi descoberto
O garoto deu entrada na unidade de saúde aos 50 dias de vida com uma crise convulsiva. A glicemia capilar dele era 18 mg/dL – a referência é de 60 mg/dL a 99 mg/dL em jejum. O quadro, considerado grave, foi revertido. Como os pais relataram que três irmãos do bebê (incluindo os dois que morreram) tinham hiperinsulinismo congênito, os médicos decidiram investigar se ele também apresentava a doença.
De acordo com relatório dos profissionais, mesmo recebendo a medicação adequada, o bebê apresentou insulina > 1.000 mcUI/ml, quando a referência é 2,6 mcUI/ml a 24,9 mcUI/ml. “Valores tão elevados de insulina não são esperados para hiperinsulinismo endógeno (quando o próprio pâncreas do indivíduo produz a insulina), mesmo em situações em que se suspeita de hiperinsulinismo congênito.”
Diante disso, os médicos pediram novo exame (dosagem de peptídeo C). De acordo com os profissionais, quem apresenta a doença também tem o peptídeo C elevado. O resultado do teste, porém, foi de 0,29 ng/mL (referência 1,1 ng/mL a 4,4 ng/mL). A incompatibilidade dos dados somada ao fato de que o bebê apresentava hipoglicemia intercalada com hiperglicemias relevantes chamou a atenção da equipe.
“Novas investigações foram realizadas, inclusive com a redução medicamentosa para observação do comportamento da glicemia no paciente em comento, tendo sido verificado um quadro ainda mais grave, com insulina marcando 6.422,3 mcUI/ml e peptídeo C suprimido, confirmando-se, portando, o quadro de hiperinsulinismo factício”, informou o hospital à polícia.
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